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REPORTAGEM 22 de maio de 2019

A import?ncia fundamental da biodiversidade da Amaz?nia para o mundo: uma entrevista com Thomas Lovejoy

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Anton Ivanov/Shutterstock.com


DESTAQUES DO ARTIGO

  • A Amaz?nia sustenta vários servi?os ecossistêmicos e serve como um enorme repositório de biodiversidade para os países da Amaz?nia e para toda a humanidade
  • O Programa de Paisagens Sustentáveis da Amaz?nia (ASL, Amazon Sustainable Landscapes), liderado pelo Banco Mundial e financiado pelo fundo global para o meio ambiente (GEF), em sua primeira fase, contribui para melhorar a gest?o de 82 milh?es de hectares de florestas no Brasil, na Col?mbia e no Peru
  • Thomas Lovejoy, especialista sobre a Amaz?nia e ecologista de renome, discute as amea?as à Amaz?nia e a melhor forma de administrá-las

A atual taxa de declínio da natureza, sem precedentes na história da humanidade, é confirmada pelo novo relatório da Plataforma Intergovernamental de Ciência e Política sobre Biodiversidade e Servi?os Ecossistêmicos (), o relatório mais abrangente sobre o assunto. A altíssima taxa de extin??o de espécies de plantas e animais provavelmente terá graves impactos sobre as pessoas do mundo inteiro.

Na ocasi?o do lan?amento do relatório, o presidente da IPBES, Sir Robert Watson, afirmou: “Ainda dá tempo de mudar, mas para isso precisamos come?ar agora e agir em todos os níveis, do local ao global”.

? para isso que o Programa Paisagens Sustentáveis da Amaz?nia (ASL, Amazon Sustainable Landscapes), liderado pelo Banco Mundial e financiado pelo GEF, vem trabalhando na Amaz?nia, regi?o que abriga 40% da floresta tropical remanescente do mundo, 25% da biodiversidade terrestre e mais espécies de peixes do que qualquer outro sistema fluvial do planeta. Com sua abordagem regional integrada, o ASL visa a aprimorar a prote??o e a gest?o de 82 milh?es de hectares de florestas no Brasil, na Col?mbia e no Peru.

Apelidado de "Padrinho da Biodiversidade", o renomado ecologista Thomas Lovejoy trabalha na Amaz?nia há mais de 50 anos. Ele falou conosco sobre as press?es que a regi?o enfrenta e os motivos para protegê-la, além de propor algumas solu??es; também explica por que a Amaz?nia precisa ser gerida como um sistema integrado e com decis?es ponderadas e graduais.


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O ecologista Thomas Lovejoy

Foto: Slobodan Randjelovic


A Amaz?nia é uma das poucas áreas florestais remanescentes e abriga talvez um quarto das espécies terrestres do planeta. Por que essa biodiversidade é t?o importante?

A floresta e os rios da Amaz?nia abrigam uma enorme variedade de espécies: algumas endêmicas (ou seja, que só ocorrem ali), outras amea?adas de extin??o e muitas ainda desconhecidas.

Essa biodiversidade é importante para o mundo inteiro. Todas as espécies deste sistema incrivelmente biodiverso representam solu??es para um conjunto de desafios biológicos; podem ter um potencial transformador e gerar benefícios para toda a humanidade. Por exemplo, a descoberta de inibidores da enzima conversora de angiotensina (ACE), inspirada por estudos realizados com o veneno da Bothrops asper (espécie de serpente tropical encontrada na Amaz?nia), ajuda centenas de milh?es de pessoas em todo o planeta a controlar a hipertens?o. Há uma gama de espécies muito ricas e promissoras aguardando ser descobertas. Um exemplo s?o as formigas cortadeiras. Essas formigas colhem e usam folhas como manta para os fungos que cultivam, evitando deliberadamente as folhas que contêm fungicidas naturais. O estudo das espécies que essas formigas evitam pode ajudar a identificar novos fungicidas naturais. Os conhecimentos das popula??es indígenas s?o muito importantes para a atingirmos esse potencial. A biodiversidade também tem import?ncia em nível local, pois constitui o capital natural que sustenta diversas atividades humanas; mais especificamente, os meios de subsistência das popula??es pobres ao redor do planeta. Por exemplo, os bagres e o pirarucu s?o itens importantes na culinária local.

A biodiversidade da Amaz?nia também é fundamental para os sistemas globais, pois influencia o ciclo global do carbono (e, portanto, a mudan?a climática) e os sistemas hidrológicos hemisféricos, servindo como uma importante ?ncora para o clima e para as chuvas na América do Sul.

A maioria das pessoas sabe que a Amaz?nia armazena grandes quantidades de carbono e, portanto, está ciente de sua influência na mudan?a climática, mas você poderia falar mais sobre os ciclos hidrológicos?

Poucas pessoas sabem que a Amaz?nia produz cerca de metade de suas próprias chuvas, além de levá-las até o sul da Argentina, contribuindo para a produ??o agrícola. Se esse ciclo hidrológico se romper, poderá gerar um ponto de inflex?o que resultará na convers?o de partes da floresta tropical em savanas secas ou até mesmo em caatingas, além de afetar negativamente as chuvas e a agricultura em toda a América do Sul. Eu e o cientista climático Carlos Nobre acreditamos que está muito próximo e que as secas de 2005, 2010 e 2016 já s?o os primeiros sinais dessa mudan?a. Mas a boa notícia é que o reconhecimento dessa possibilidade e o reflorestamento podem ajudar a reestabelecer uma margem de seguran?a.

Na sua opini?o, quais s?o as principais amea?as à Amaz?nia e quais as solu??es para resolvê-las?

Infelizmente, a press?o sobre a Amaz?nia está cada vez maior. Os lugares de maior risco s?o o sul e o sudeste (regi?es do Pará, Mato Grosso e Rond?nia), mas também há press?es surgindo em novos locais.

Um dos maiores problemas é o desmatamento motivado por atividades agropecuárias. O desenvolvimento da infraestrutura também é uma grande amea?a, especialmente se alguns projetos continuarem do jeito que est?o. Precisamos pensar em alternativas e trabalhar com os governos estaduais para criar modelos de desenvolvimento sustentável que preservem a floresta.

Parte da resposta deve ser o desenvolvimento de bioeconomias sustentáveis. Se os agricultores forem remunerados pelas atividades que protegem a floresta, imagino que sua resposta será positiva. Outros exemplos s?o a pesca e a aquicultura. S?o atividades de grande import?ncia para a bioeconomia e para a alimenta??o de uma popula??o mundial cada vez maior. Tudo depende, no entanto, de como a aquicultura é implementada. O estado do Acre desenvolveu uma indústria de aquicultura bastante produtiva nos últimos 10 anos. Essa atividade de base biológica faz todo o sentido e devemos buscar oportunidades semelhantes, recorrendo também aos conhecimentos indígenas para identificar novas oportunidades econ?micas, sempre pautadas pela bioética.

Cidades sustentáveis também s?o essenciais, mas exigem um planejamento cuidadoso e criativo. As atividades econ?micas em Manaus, por exemplo, usam em grande parte materiais n?o provenientes da floresta. Precisamos iniciar um diálogo sobre o que as cidades devem fazer para trazer benefícios reais para as suas popula??es, com muito menos impacto sobre as florestas.

A infraestrutura de baixo impacto é outra solu??o. Um excelente exemplo é a eleva??o das rodovias na regi?o da Mata Atl?ntica. A linha de transmiss?o projetada entre Manaus e Roraima n?o teria um impacto t?o forte se o projeto atual (em linha reta) fosse alterado e seguisse a rodovia já existente no local, evitando novos desmatamentos e transtornos para os povos indígenas. Da mesma forma, precisamos pensar em como produzir energia n?o-fóssil a partir de barragens hidroelétricas de forma a preservar os fluxos de sedimentos e os trajetos de espécies migratórias como os grandes bagres, cujo ciclo de vida se estende desde o estuário até as cabeceiras.

O relatório da IPBES ressalta que a perda de habitats (e, portanto, da biodiversidade) é mais lenta nos territórios administrados por povos indígenas. Qual é o papel dessas comunidades (e de seus conhecimentos) na prote??o e manuten??o da biodiversidade?

Os povos indígenas têm um papel importantíssimo. Eles possuem vastos conhecimentos sobre os animais e plantas locais e tiram proveito da floresta, de várias formas, há milhares de anos.

A maioria dos povos indígenas tem um estilo de vida bastante sustentável. S?o, basicamente, grandes guardi?es da floresta; atualmente, cuidam de cerca de um quarto da Amaz?nia. Sabemos que, em alguns casos, as práticas dos povos indígenas mudam, mas, no momento, os povos indígenas est?o entre os melhores gestores da biodiversidade nas florestas. S?o povos extremamente inteligentes, capazes de embarcar na era digital rapidamente, quase de um dia para o outro; por exemplo, usando GPS no mapeamento de suas terras. As culturas dos povos indígenas s?o absolutamente fascinantes.

Ao ajudar a evitar o desmatamento, eles têm um papel fundamental na prote??o da biodiversidade e na luta global contra a mudan?a climática. A administra??o florestal é um grande favor que os povos indígenas fazem para toda a humanidade. Eles s?o grandes aliados na prote??o da Amaz?nia e merecem muito respeito e gratid?o dos países amaz?nicos e do mundo inteiro pelo trabalho que fazem!

O Banco Mundial, o PNUD e o WWF apoiam o Programa ASL, financiado pelo GEF. O ASL tem como objetivo vincular áreas protegidas a paisagens produtivas. Essa é uma boa estratégia?

Eu n?o tenho a menor dúvida! O modelo daqui para frente precisa incorporar as aspira??es humanas aos sistemas naturais. Conectar as áreas protegidas trará mais seguran?a para a biodiversidade, pois à medida que sentimos cada vez mais os efeitos da mudan?a climática, os animais e as plantas passam a buscar condi??es mais propícias. Ou seja, as áreas isoladas apresentam um grande problema e conectá-las é o que devemos fazer daqui para a frente. Essa conectividade também ajudará a preservar as condi??es hidrológicas; a vegeta??o ao longo dos cursos d’água reduz a eros?o do solo e viabiliza ainda mais conex?es. Vale ressaltar, no entanto, que as conex?es florestais em terra firme também s?o cruciais.

Ao administrar um sistema como a Amaz?nia, é fundamental considerar decis?es graduais. Cada pequena mudan?a na estrutura mais ampla pode gerar efeitos cumulativos; caso os efeitos sejam negativos, as consequências podem ser vastas. Visto que a Amaz?nia é um sistema que se estende até o topo dos Andes, as florestas mais abaixo sentem os efeitos do que ocorre em altitudes mais elevadas. As atividades humanas s?o uma pe?a importante do quebra-cabe?a na administra??o desse sistema. Sei que as pessoas est?o preocupadas com a recente mudan?a da política brasileira em rela??o à abertura da Amaz?nia. Acredito, no entanto, que quando o governo brasileiro se der conta da import?ncia da Amaz?nia como sistema, bem como sua contribui??o para a economia e a agricultura do país, ficará convencido de que a sustentabilidade e o funcionamento da Amaz?nia s?o do interesse de todos.



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